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Violência Obstétrica: responsabilidade institucional e proteção jurídica

  • Foto do escritor: Phillipe Giovanni Rocha Martins da Silva
    Phillipe Giovanni Rocha Martins da Silva
  • 22 de jul.
  • 3 min de leitura

Atualizado: 2 de ago.

Os casos de violência obstétrica tem aumentado sistematicamente no país nesses últimos anos. Esse tipo de violência se manifesta de diversas formas, seja por meio de condutas desrespeitosas, abusivas ou negligentes praticadas durante o atendimento médico pré-natal, parto e até mesmo puerpério, comum tanto na saúde pública quanto na saúde privada do Brasil.


Violência obstétrica
Imagem: Freepik

Um levantamento preliminar do estudo “Nascer no Brasil 2”, conduzido pela Fiocruz com base em dados coletados entre 2020 e 2023 em 465 maternidades do país, revela que mulheres negras, adolescentes ou com mais de 35 anos, de baixa escolaridade e atendidas pelo SUS, estão mais vulneráveis à violência obstétrica. Embora nem sempre seja percebida como uma violação de direitos, tais condutas ferem princípios constitucionais expressos, especialmente os da dignidade da pessoa humana, presente no art. 1º, III da CF/88, da integridade física e psíquica (art. 5º, caput), e do direito à saúde, art. 6º e 196 da Constituição, além de outras diversas normas éticas.


A ausência de uma tipificação penal específica no ordenamento jurídico brasileiro é outro grande problema enfrentado pelas mulheres que são vítimas dessa violência. Embora sem amparo legal específico, diversas condutas que se enquadram como violência obstétrica podem e devem ser tratadas à luz do Código Penal, notadamente nos crimes de lesão corporal, constrangimento ilegal, ameaça ou omissão de socorro. No plano cível, por sua vez, a responsabilização civil por danos morais e materiais é plenamente cabível, sobretudo quando se demonstra a violação à autodeterminação da paciente e à sua integridade emocional, muito comum nesse tipo de violência.


Do ponto de vista normativo, a Lei nº 8.080/1990 impõe ao Sistema Único de Saúde a obrigação de garantir um atendimento humanizado, ético e respeitoso para os indivíduos, o que se estende aos serviços privados (Saúde suplementar). A Lei nº 14.108/2021, por sua vez, reforça a posição da gestante ao assegurar o direito de ter acompanhante durante o parto, o que funciona não apenas como medida de apoio emocional, mas também como proteção contra abusos e omissões médicas durante procedimentos. 


A atuação dos órgãos de classe também tem sido relevante nesses casos. Resoluções como a de nº 2.232/2019 do Conselho Federal de Medicina e outras diversas normativas da Agência Nacional de Saúde, reforçam diretrizes de respeito à autonomia da mulher, ao consentimento informado e à transparência na prática obstétrica. Esses instrumentos normativos têm servido como parâmetros técnicos e éticos para a análise de condutas médicas e hospitalares.


Dessa forma, é imprescindível reconhecer que a violência obstétrica não se limita apenas ao ato médico isolado, mas pode também refletir falhas institucionais, protocolos ultrapassados ou cultura organizacional desatenta à experiência da mulher como sujeito de direitos. Por isso, além da responsabilização individual, é necessário também falar em uma reestruturação de práticas institucionais, sob pena de violação sistêmica e contínua desses e de outros direitos. Uma cesariana forçada, por exemplo, é uma situação típica de violência obstétrica, bem como a omissão de um hospital no cuidado com a parturiente, que pode inclusive levá-la à óbito.  A simples internação do plano de saúde, sem o devido tratamento e acompanhamento adequado da mulher, também pode caracterizar um caso de violência obstétrica e abrir espaço para uma ação indenizatória.


Com o aumento da judicialização da saúde no país, a análise jurídica precisa ir além da reparação pontual: exige compreender toda a estrutura de saúde envolvida no caso concreto. A advocacia tem papel fundamental na identificação, prevenção e combate a esse tipo de violência, contribuindo para a construção de uma cultura jurídica que valorize o cuidado humanizado e a integridade da mulher. 


Violência obstétrica

Phillipe Martins

Advogado e Professor. Mestre em Direito e Especialista em Direito Médico e da saúde.

 
 
 

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